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Resumão Científico Semanal: Você realmente sabe manejar fluidos intravenosos?

No contexto de atendimento ao paciente grave, lidamos constantemente com a necessidade de administração de soluções para reposição volêmica, manutenção de rotina, reposição ou até mesmo redistribuição de volume, tornando o gerenciamento dessa prática cada vez mais desafiador devido ao dinamismo dessas necessidades.
Hoje eu trouxe uma revisão MARAVILHOSA da Critical Care Nurse, super objetiva, que aborda os 5 R's para melhor gerenciamento da administração de fluidos e indicações, efeitos adversos e uma breve discussão sobre melhores práticas na fluidoterapia (cristaloides isotônicos não balanceados e balanceados, cristaloides hipotônicos e hipertônicos e coloides).


Fisiologia dos Fluidos

O texto revisa a importância de entendermos como é distribuído o volume de líquidos no nosso organismo, ressaltando que indivíduos do sexo feminino possuem em torno de 50% do peso corporal constituído de água e indivíduos do sexo masculino, em torno de 60%. Cerca de dois terços desse líquido encontra-se no meio intracelular e um terço nos meios intravascular e intersticial. Lembrando que essas variáveis ​​podem ser influenciadas por vários fatores, incluindo idade, sexo, peso e doença crítica. 

Fonte: pebmed

Ao pensarmos nas demais moléculas existentes no nosso organismo, inserimos dois conceitos importantes: osmose (
distribuição de água de áreas de baixa concentração de soluto para áreas de alta concentração de soluto para manter o equilíbrio) e tonicidade (força motiz da osmose). Ainda de acordo com o texto "a tonicidade de uma solução está relacionada à sua osmolaridade, que é a concentração total de solutos por litro de fluido. A osmolaridade relativamente igual dos fluidos intravenosos isotônicos e do plasma humano permite a passagem fácil do fluido entre os espaços intersticial e intravascular".

Os 5 R's para o uso seguro e eficaz de fluidos intravenosos: uma ferramenta para a Enfermeira de cuidados críticos

A revisão traz, de forma clara e objetiva, os principais objetivos da fluidoterapia, visando alertar e educar a profissional para uma prática segura e efetiva. Os 5 R's para o uso seguro e eficaz de fluidos intravenosos são: RESSUSCITAÇÃO, MANUTENÇÃO DE ROTINA, REPOSIÇÃO, REDISTRIBUIÇÃO e REAVALIAÇÃO.

Ressuscitação:

Fonte: HCFMUSP


A ressuscitação visa restaurar o volume intravascular em pacientes hipovolêmicos com risco de vida e perfusão de órgão-alvo comprometida, a exemplo de pacientes com grandes perdas gastrointestinais, sepse, hemorragia, choque ou lesão térmica. Os principais parâmetros avaliados nessas situações, do ponto de vista de volemia, são: hipotensão, taquicardia, diminuição do débito urinário ou elevação dos níveis séricos de lactato. Ainda de acordo com a revisão, os indicadores de ressuscitação volêmica bem-sucedida geralmente incluem: PAM maior ou igual a 65 mmHg, débito urinário de, pelo menos, 0,5 mL/kg/h e, no caso dos pacientes sépticos, melhora nos níveis de lactato. Lembrando que, nos pacientes com insuficiência cardíaca, é importante o monitoramento da pré-carga. 

Manutenção de Rotina:

Para manutenção de rotina, são considerados os pacientes euvolêmicos e hemodinamicamente estáveis, que não tem ingestão de líquidos via enteral. No caso de pacientes graves, são considerados aqueles com lesões neurológicas complicadas por disfagia sem sonda enteral, com obstrução gastrointestinal e aqueles em jejum. O texto ressalta que manutenção de rotina NÃO é indicada para reposição eletrolítica e nem suporte nutricional.

Reposição:

Neste caso, o objetivo é reestabelecer a homeostase eletrolítica. Pacientes que tiveram perdas de volume por vômito ou diarreia intermitente, diurese excessiva, hipotermia terapêutica e insuficiência adrenal são candidatos a receberem reposições (neste tópico devo ressaltar a importância da alta vigilância na reposição de eletrólitos. No Brasil, a dupla checagem é considerada uma prática que aumenta a segurança na administração de medicamentos de alta vigilância, como é o caso das reposições eletrolíticas).

Redistribuição:

Os autores discorrem sobre a importância do adequado manejo para este perfil de pacientes. Conforme o texto, " a redistribuição, também conhecida como terceiro espaçamento, é uma consequência do aumento da permeabilidade capilar que faz com que o fluido se desloque [para o meio extravascular]. A má retenção de líquido no compartimento intravascular resulta em um quadro clínico complexo de depleção de volume na presença de edema. Um exemplo dessa situação citado pelos autores é a sepse, que leva a redistribuição devido a resposta inflamatória. 


Para essas situações, os autores recomendam avaliação criteriosa, prioridade aos coloides e enfatizam que os sinais clínicos de déficits de fluidos não são confiáveis, devido ao fato que que a sobrecarga de volume mascara a depleção de volume intravascular. E quais são as estratégias recomendadas? Mobilização de volume intersticial com o uso de coloides, administração de volumes pequenos e incrementais para ressuscitação, além da restrição de volume total e duração das reposições quando possível.

Reavaliação

Devido à dinâmica da evolução clínica e à variedade de condições associadas, os pacientes podem apresentar sensibilidade imprevisível à administração de fluidos. De acordo com os autores, se nós não estivermos capacitados para lidarmos com essas variedades, podemos contribuir com a morbidade e mortalidade dentro da Terapia Intensiva. Por isso "é crucial monitorar vigilantemente e avaliar rotineiramente os pacientes para ajustar ou interromper os fluidos quando clinicamente apropriado. Os enfermeiros devem integrar as avaliações clínicas e laboratoriais, incluindo exame físico, sinais vitais, débito urinário, eletrólitos, função renal e estado ácido-básico, para identificar quando as mudanças na fluidoterapia são necessárias."

Por fim, os autores discorrem sobre as melhores práticas no gerenciamento e  administração de cristaloides isotônicos não balanceados e balanceados, cristaloides hipotônicos e hipertônicos e coloides, trazendo diversas evidências para a indicação e contraindicação de cada tipo de fluido. Para acessar o texto completo, clique aqui.

Se quiser ver meu vídeo sobre este conteúdo, clique aqui.

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